27 de abr. de 2009

O RAIO-X DO MEDO

O PSIQUIATRA ANDRÉ SOUZA REGO, DO INSTITUTO DE PESQUISAS SISTÊMICAS E DESENVOLVIMENTO DE REDES SOCIAIS (NOOS), DO RIO DE JANEIRO, EXPLICA COMO FUNCIONA O MEDO, SUA FUNÇÃO E O QUE ACONTECE QUANDO SE TEM MEDO DEMAIS (OU DE MENOS)

O QUE O MEDO SIGNIFICA, NA PRÁTICA, PARA O CORPO?
Vivemos esse processo do medo em diversos momentos do dia, como quando precisamos frear bruscamente o carro. Somos inundados por adrenalina, um hormônio que ativa o sistema nervoso simpático, aquele responsável por nos fazer agir e reagir quando preciso. Ele acelera os batimentos cardíacos, aumenta a pressão arterial e a concentração de açúcar no sangue, e ativa o metabolismo geral do corpo. Tudo isso acontece sem que tenhamos controle. Em situações de medo, o corpo fica pronto para reagir, portanto outras funções, como o sono, a fome, a atenção e a libido ficam de lado.

A FUNÇÃO DO MEDO É BASICAMENTE NOS PROTEGER?
Mais do que isso. Somos seres que respondem ao meio ambiente. Nossas respostas possuem apenas duas dimensões, a raiva e o medo. Funciona como um gráfico, sendo a raiva (ou a gana, vontade de viver, energia) a linha vertical e o medo (ou prudência, vontade de sobreviver e se preservar). Pessoas com falta de raiva ou energia estão apáticas. Com excesso, estão irascíveis, provavelmente em estado de euforia ou mania. Já pânico é o medo exacerbado. E medo de menos é distração, que pode significar distúrbio de atenção, por exemplo. Combinações desses desequilíbrios representam todas as manifestações de doenças psiquiátricas. A saúde mental está justamente na capacidade de ter reações flexíveis. Medo quando é preciso, energia quando possível.

É PRECISO TER UM POUCO DE MEDO ENTÃO?
Exato. Veja um exemplo: você decide ir ao jogo do seu time no Maracanã, vestido com a camisa e levando uma bandeira. No entanto, ao sair na rua, vê uma multidão do time adversário bem em frente a sua porta. O excesso de medo poderia fazer com que ficasse trancado no banheiro, paralisado, coração acelerado. É pânico, e faria você perder o jogo. Já medo de menos faria com que você saísse à rua. Igualmente, não chegaria ao jogo, já que a torcida não está nem aí se você está enfrentando ou apenas distraído. A euforia é assim: falta de medo com excesso de energia. O ideal é voltar pra casa, colocar uma camiseta neutra e levar a do time em uma sacola, ligar para o amigo que está vindo encontrar, chamar um táxi. Não seria a reação mais prudente? Tem um pouco de medo nela.

MAS O QUE LEVA O PAVOR A TOMAR CONTA ÀS VEZES?
Nosso corpo funciona como uma máquina, e uma máquina sobrecarregada pifa em algum momento. Quando a demanda de reação de fuga ou luta está muito alta em nosso corpo, ou seja, quando enfrentamos muitas situações que ameaçam nossa integridade física ou identidade existencial, corremos o risco de alguns neurotransmissores "travarem". Aí a pessoa passa a ter reações sem relação de causa e efeito e pode reagir como se tivesse uma arma apontada para a cabeça, suando e com taquicardia, embora não esteja em perigo real. O inverso poderia ocorrer também, e a pessoa ficar deprimida. Esse tipo de coisa tende a acontecer cada vez mais, já que nossas rotinas modernas levam a essa exaustão. Trânsito, violência, excesso de trabalho, internet, celular...

E AS FOBIAS?
Fobias são medos específicos. Devem ser tratadas, assim como o pânico (que é a reação de medo generalizada) e o estresse pós-traumático (que apresenta os mesmos sintomas, mas tem uma causa pontual, como um assalto ou acidente). No entanto, é importante entender que o medo salvou a nossa espécie. Por exemplo: se eu, homem das cavernas, comesse uma planta venenosa, teria o reflexo do vômito na hora. Por fobia, sentiria a mesma vontade quando visse a planta de novo. Isso não protegeria só a mim de um envenenamento, mas também a você. Eu não teria linguagem para explicar que a planta é venenosa, mas, ao ver minha reação, você entenderia que coisa boa não é. Dizem que as mulheres têm mais fobias de barata, aranha e outros animais peçonhentos porque esses já foram grandes perigos para a saúde de sua família.

Texto extraido da revista Go Outside

Nenhum comentário: